:: Cantador de Chula: o samba antigo no Recôncavo Baiano (Katharina Doring)

Título: Cantador de chula: o samba antigo no Recôncavo Baiano | Volume 4 de Série Sons da Bahia
Autora: Katharina Döring
Editora: Pinaúna Editora
Ano Lançamento: 2016
ISBN 8565792234, 9788565792233
Pags: 256 páginas

RESENHA
Por Lucas Maciel

A sinergia das artes negras se dá a partir das referências filosóficas e espirituais negro-africanas, que consideram como constrangedor se tratar da música e do canto distante da dança, visão que contrasta com a separação cientifica que fora imposta ás linguagens das artes na história cultural branco-europeia. O canto, o toque e a dança de matrizes africanas podem ser compreendidos como um comportamento estético integrado e complementar que não se limita a função de arte, espetáculo e ritual, porque faz referência a complexidade da vida em fluxo, celebrando vitórias, alegrias e conquistas, como também sofrimentos, perdas e tristezas, constituindo parte integrante do cotidiano, mesmo ou sobretudo na situação de escravo. (DORING, 2016)

O samba tem origem na época do regime escravocrata do Brasil Colônia, no século XIX, onde os negros de diferentes etnias passaram a conviver no mesmo espaço. 

Inicialmente chamado de Batuque (apelidado pelos pesquisadores), o samba era constituído por vários negros em círculo, batendo em tambores, acompanhados por mais negros, batendo na palma da mão e dançando, alternando entre o círculo e o meio da roda.

Os tambores eram os atabaques e agogôs, oriundos dos tambores dos Orixás, Vodun e Nkisi do culto de Candomblé, enquanto a palma da mão e a dança, expressões naturais do corpo, eram “ativados” com a energia do samba. O autor Artur Ramos menciona ainda os instrumentos de percussão como a “rude orquestra”.

Em frente às senzalas viam-se também grupos de Africanos formarem seus batuques, cantando e sambando sob a toada de seus lundus, ritmo bastante cadenciado e onomatopeico, representando os requebrados lascivos e luxuriosos de suas mucamas, proporcionando aos indígenas um novo sentimento musical, que se propagando entre os mestiços e se identificou com o sentimento pátrio, produzindo a nossa chula, o nosso tango ou o nosso Lundu propriamente dito.

O samba, um dos símbolos da música popular cultura Brasileira, é um termo genérico para uma infinidade de gêneros e estilos na música popular tradicional e urbana. 

Por que surgiu na Bahia?

Salvador é a primeira Capital do Brasil e tem o seu porto conectado ao centro da cidade pelo centro histórico, que está localizado na região da cidade baixa. A cidade situa-se na ponta de uma península que separa a Baía de Todos os Santos do Oceano Atlântico, onde desembarcaram mulheres e homens pretos escravizados, Aussás, Agomés, Nagôs, Gegês, ocupando a capital e o Recôncavo, no século XIX. 

Pretos de diferentes etnias se reuniam e se organizavam por etnia ou proximidade cultural em manifestações lúdicas autorizadas pelos senhores de escravos, com objetivo de evitar mais revolta contra eles. Entretanto, os senhores não perceberam que ali davam um tempo para que os negros se reunissem e nesses espaços quilombos urbanos, pudessem se fortalecer e buscar estratégias de sobrevivência, articulando revoltas, como o Levante dos Malês de 1835. 

Após muitas revoltas, o governo decide proibir as reuniões, dos negros, mas elas continuaram a acontecer, desaguando em perseguições policiais, fechamento de casas de candomblé, mortes, apreensão de objetos ritualísticos e até instrumentos sagrados. 

É nesse contexto histórico que o samba nasce – como a força motriz que dá voz a um povo.