“Lero-Lero” (Gera Samba)

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ANÁLISE DE FONOGRAMA, “LERO LERO”, DA GRUPO GERA SAMBA (1990)

Por Lucas Decliê

Lero lero é uma música lançada no primeiro disco da banda Gera Samba em 1990 pela gravadora Grupo Gera. No início dos anos 90 era bastante comum que bandas de pagode e samba pegassem músicas de domínio público e criassem alguns pot-pourri em cima, tal qual o caso de Lero Lero. Esse breve ensaio pretende analisar esta canção a partir da metodologia Universo Percussivo Baiano (UPB) de Letieres Leite, que se baseia no sistema de claves rítmicas.

Nesta mesma faixa há um trecho que contém uma versão da música “Ei, moça” do Ile Aiyê  e por se tratar de um pot-pourri a forma  dela não é convencional como em outras músicas. Dividirei a análise em duas partes, a primeira da música “Lero Lero”, que está na forma A, B, C, A, B, e na segunda parte da música “Ei, moça”, que executada após o solo do saxofone tocada na forma A, B, A, B. 

Lero lero está no tom de F# e começa com um bordão de violão, chamada de surdo, e logo em seguida entra a banda completa. Na introdução e na parte A os acordes usados são F#, D#m, G#m e C#7, nos graus: I, vi, ii, V; sequência harmônica bastante utilizada nos sambas de roda, pagode e em outros gêneros. Logo na introdução também é possível perceber que a clave do Samba Duro está sendo tocada no tamborim, e acompanhada pelas palmas, que faz uma variação da mesma clave. O pandeiro é bastante presente preenchendo os espaços vazios e complementando os arranjos de percussão. Ainda na introdução o cavaquinho e o violão tocam apenas F# e C#7; o I e V grau, respectivamente. A harmonia completa é tocada somente pelo baixo. A melodia da parte A está na clave do samba duro, com a utilização de semicolcheias e suas acentuações melódicas também estão todas em clave. Outra característica dessa parte é o jogo de pergunta e resposta na melodia feita pelo vocalista e pelos backing vocals.

Melodia e clave da parte A:

parte a

Outra lente a ser observada nesta composição é a parte B; nela a harmonia utilizada é B, A#m, B e C#7, (IV, iii, IV, V). Quando entra o banjo e as palmas ocorre uma variação da clave do Samba Duro marcando o primeiro e terceiro tempo. Neste momento, a melodia muda sua característica e passa a utilizar notas mais longas com saltos e intervalos maiores, diferente da parte A, porém, mantendo a mesma estética de pergunta e resposta entre os vocais. 

Melodia, clave tocada no tamborim e palmas da parte B:

parte bb

Já na parte C repete – se a harmonia da primeira parte A (vi, ii, V, I), e a melodia volta a ser mais rítmica, mantendo o jogo de pergunta e resposta. A clave do samba duro continua sendo tocada no tamborim, só que agora com acréscimo das palmas que repetem a clave.

Melodia, clave tocada no tamborim e palmas da parte C:

parte c new

Depois da parte C, a música se repete com a parte A e B da mesma maneira como da primeira vez, seguindo para um solo de sax tenor curto de 4 compassos. As acentuações do solo do saxofone estão em clave também. 

Solo de saxofone, clave tocada no tamborim e palmas (a parte está escrita para o sax alto):

solo sax

Após o solo do saxofone é tocado a música “Ei, moça” do Ilê Aiyê. No retorno da parte A, a harmonia utilizada é novamente o vi, ii V, I. Depois de 6 compassos é tocado a parte B novamente, utilizando a harmonia B, A#m, B, A#m, G#m, C#7, tendo o acréscimo do acorde de G#m nessa parte em relação à parte B da primeira volta da música. Nos 3 compassos finais da parte B a harmonia utilizada é o F#, D#m, G#m, C#7. Neste trecho é utilizado uma linha melódica mais rítmica e as palmas tocadas estão tocando a clave do samba afro do Ilê enquanto o tamborim continua tocando a clave do samba duro.

Melodia, clave tocada no tamborim e palmas da parte B de “Ei, moça”:

ile

É repetido mais uma volta na música das partes A e B, seguindo os arranjos da segunda volta da música citados acima. A música termina em fade out enquanto os vocais seguem fazendo o jogo de pergunta e resposta, as palmas agora marcam o tempo forte no primeiro e terceiro tempo da clave do Samba Duro, como na primeira parte, e a harmonia tocada no fim é novamente o F#, D#m, G#m, C#7 (I, vi, ii, V).
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1 O mais antigo bloco afro do carnaval de Salvador. Fundado em 1974 por moradores do bairro do Curuzu, constitui um grupo cultural que promove a expansão da cultura de origem africana no Brasil.

2 Estrutura que indica as diferentes partes que constituem a peça musical.

3 O Samba Duro é um subgênero da clave matricial do Cabila, e está presente em diferentes variações de samba e pagode.

4 A música está em clave quando a todo o arranjo da música se baseia sobre influência de uma célula rítmica. 

5 Quando o instrumentista toca uma linha melódica que só é completada quando o outro músico toca outra linha logo em sequência, completando a frase musical.